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Constantino, Larry Fink e suas conversões

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Constantino, o Grande, foi imperador de Roma no início do século IV. Entre seus feitos mais notáveis está a mudança da capital do império para a cidade de Bizâncio, hoje chamada Istambul. Porém, pode-se dizer que sua conversão ao cristianismo foi o evento com maior impacto na definição do mundo como o conhecemos. Reza a lenda que, na noite anterior a uma importante batalha, no ano 312, Constantino teria sonhado com uma cruz com os dizeres "com esse sinal vencerás", e, no dia seguinte, mandado pintar cruzes nos escudos de seus soldados e, de fato, conseguido a vitória.

Evidentemente, a relevância da conversão de Constantino vai além do caráter pessoal e está intimamente ligada ao império que ele comandava. Menos de oito meses após essa batalha, foi proclamado o Edito de Milão, que estabeleceu a neutralidade religiosa do império e acabou com a perseguição oficial aos cristãos. Isso foi fundamental para o crescimento do cristianismo no império e, posteriormente, no mundo. Hoje, mais de 30% da população mundial é de cristãos.

A BlackRock é um verdadeiro império do mercado financeiro. Com cerca de USS 10 trilhões sob gestão, cerca de cinco vezes o PIB do Brasil, a empresa atua globalmente em diversas classes de ativos. Com participação acionária relevante na maioria das grandes empresas, a BlackRock, naturalmente, possui um grande poder e influência e, em certas circunstâncias, faz uso deles, como no impulsionamento à adoção de práticas ESG por parte das companhias. Esse império sempre esteve sob o comando de um homem, Larry Fink, que, por razões obvias, também goza de grande poder e influência.

Assim como Constantino, Fink passou por uma conversão. Não que ele tenha abandonado sua religião, o judaísmo, mas sim a sua opinião cética em relação ao bitcoin e aos criptotivos em geral.

Em outubro de 2017, uma frase dita por Fink calou fundo na indústria cripto: "o bitcoin só mostra quanta demanda por lavagem de dinheiro existe no mundo". Na ocasião, o bitcoin já havia mais que quintuplicado o seu valor no ano e muitas pessoas relevantes dos mercados tradicionais foram vocais contra os criptoativos, com o bitcoin concentrando a grande maioria das críticas.

Passaram-se anos e, para desgraça de seus detratores, o bitcoin e outros criptoativos floresceram mais que qualquer investimento tradicional, a despeito das duas grandes crises que se abateram desde então, em 2018 e 2022. Eis que, em junho de 2023, a BlackRock entra com um pedido junto ao regulador dos EUA para lançar um ETF à vista (spot) de bitcoin. No mês seguinte, as palavras de Fink sobre bitcoin e criptoativos já eram bem mais favoráveis: "eu acredito que o papel de cripto é digitalizar o ouro, de várias maneiras".

Mas, se ainda restava alguma dúvida sobre sua conversão, ela foi dirimida em outubro, durante uma forte alta do bitcoin: "Parte dessa alta vai muito além do boato — acho que a alta de hoje tem a ver com uma fuga para a qualidade ('fight to quality"), com todas as questões em torno da guerra israelense agora, do terrorismo global, e acho que há mais pessoas realizando uma fuga para a qualidade". Amém! Se não bastasse, em meados de novembro, a BlackRock também aplicou para ter um ETF a vista de Ethereum.

Assim como no caso de Constantino, a conversão de Larry Fink vai muito além do caráter pessoal. Por conta do excelente retrospecto de aprovação para listagem de novos produtos que a BlackRock possui nos EUA, o simples fato de a companhia ter entrado com o pedido ja fez com que os agentes de mercado aumentassem suas expectativas de que o regulador, finalmente, venha a permitir os ETFs à vista de criptoativos. Além disso, a maior gestora de ativos do mundo conta com uma forte rede de distribuição de produtos e um grande número de assessores financeiros baseiam-se nos portfólios-modelo criados por ela. Em resumo, é provável que a adesão da BlackRock marque, definitivamente, a consolidação de "cripto" como uma classe de ativos e sua posição dentro dos portfólios de ativos tradicionais.

Quase 17 séculos depois, ainda existem controvérsias a respeito da conversão de Constantino. Alguns estudiosos alegam que ela foi mais motivada por estratégia política do que por questões religiosas. Não é difícil imaginar que alguns possam ter desconfiança sobre a sinceridade da conversão de Larry Fink. Verdadeira ou oportunista, fato é que sua mudança de posição tende a ter grande impacto na massificação dos investimentos em criptoativos. Talvez seja preta a pedra sobre a qual as criptos edificar-se-ão como uma classe de ativos com bilhões de adeptos. 

 

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